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PANORAMA DO HORROR NO CINEMA BRASILEIRO
Carlos Primati

Esta filmografia compila 144 longas profissionais brasileiros que contenham elementos identificados com o horror, independentemente de classificação de gênero (drama, comédia, musical, romance, policial etc.). A filmografia a seguir não pretende ser completa, mas procura compilar o maior número possível de filmes brasileiros que mantenham diálogo com o gênero do horror. A dificuldade em rastrear essa produção de longas-metragens se deve à inexistência de dados sistemáticos e à falta de registros confiáveis e em bom estado. Este panorama lista os trabalhos mais importantes realizados nesta temática. A elaboração da filmografia contou com a colaboração do editor do livro e de sua equipe, o que contribuiu para decidir pela inserção destes filmes na seção, objetivando aperfeiçoar as informações aqui disponíveis.

A lista inclui coproduções internacionais realizadas no país em parceria entre companhias brasileiras e estrangeiras. Não foram considerados os filmes estrangeiros dirigidos por cineastas brasileiros, mas é interessante mencionar a produção inglesa Dead of night (Na solidão da noite), de 1945, uma antologia de episódios cuja melhor história foi dirigida pelo carioca Alberto Cavalcanti, e o recente The morgue (Cadáveres 2), de 2008, codirigido em Hollywood pelo cearense Halder Gomes e pelo carioca Gerson Sanginitto.

Vale citar também Demoni 3 (Noite infernal), mais conhecido como Black demons, filme italiano – falado em inglês – realizado em 1991 no Rio de Janeiro, dirigido por Umberto Lenzi com elenco internacional e coadjuvantes brasileiros. Repleto de elementos preconceituosos e ofensivos, é curioso por mostrar a visão estrangeira acerca da macumba, mostrando um ritual com todos os seus elementos pitorescos. A premissa poderia render um bom exemplar de horror, sobre seis escravos cegos, enforcados há cerca de um século, que ressuscitam por meio de rituais de macumba, tornando-se zumbis que buscam vingança contra os homens brancos, mas redunda num filme apenas mediano.

O horror não é novidade na cinematografia nacional. É provável que elementos de horror já se mostrassem presentes em narrativas ficcionais brasileiras nos tempos do cinema mudo. A pouca documentação disponível sobre os primórdios do cinema nacional inclui informações fragmentadas de filmes – hoje considerados completamente perdidos – que possivelmente dialogavam com o macabro, o sobrenatural e o fantástico. Obras como O diabo (1908), inspirado nos curtas fantásticos de Georges Méliès, e Le film du diable (1917), cujas poucas informações a respeito de seu conteúdo são contraditórias, têm títulos inegavelmente sugestivos, mas pouco se sabe a respeito deles além disso.

Na mesma época, a dramatização em filme de violentos crimes verídicos também originou exemplares contendo elementos que, mais tarde, seriam identificados com o horror. Películas criminais como Os estranguladores, O crime da mala e A mala sinistra, todos de 1908, fizeram muito sucesso na época, inspirados diretamente na agitada crônica policial. O filão rendeu inúmeros exemplares, todos com sessões concorridas e polêmicas, com títulos como O crime dos Banhados (1914), O crime de Cravinhos (1920) e O crime da mala (1928), este último com duas versões no mesmo ano, tratando de outro assassinato, sem relação com o filme de vinte anos antes. Décadas mais tarde, casos similares serviriam de tema para filmes sensacionalistas vinculados à linguagem própria do horror, como O estripador de mulheres (1978) e O maníaco do parque (2002).

Ainda no período mudo, chamam a atenção informações de obras como A feiticeira da rua da moeda (1930), produção recifense que talvez não tenha sido concluída, e O mistério do dominó preto (1931), história criminal que teria sido o primeiro filme brasileiro dirigido por uma mulher, Cléo de Verberena. Estes se juntam a um punhado de títulos que caíram no esquecimento e se tornaram meros vultos numa filmografia que talvez jamais seja devidamente decifrada.

Por último, é importante salientar que não foram consideradas, para a compilação deste panorama, a significativa produção de vídeos de horror amadores. Essa vertente surgiu em meados da década de 1980, com o advento do padrão de vídeo VHS, e continua crescendo, agora em formato digital, democratizando a feitura de obras de ficção, inclusive longas-metragens. Enquanto que o formato vídeo é meramente um detalhe decorrente da restrição orçamentária em filmes como Mangue negro e Morgue story, essa mesma tecnologia – de fácil acesso – é a ferramenta que possibilita a concretização de projetos de muitos realizadores amadores.

É virtualmente impossível fazer um levantamento completo das realizações desse tipo; muitas das quais jamais romperam os limites de um fechado círculo de amigos, sem possibilidades para exibição em cinema ou mesmo distribuição em vídeo. Porém, alguns nomes merecem destaque por terem superado tais obstáculos. O catarinense Petter Baiestorf conquistou um impressionante séquito de admiradores por meio de filmes ofensivos e transgressores, que se assumem de mau gosto, inspirando-se nos filmes da produtora norte-americana Troma e em cineastas como John Waters, combinando horror, violência, sexo e música barulhenta (sempre em doses extremas). Dentro do gênero horror, o prolífico Baiestorf realizou filmes como Criaturas hediondas (1993), Eles comem sua carne (1996), Raiva (2001) e Arrombada: vou mijar na porra do seu túmulo!!! (2007), entre outros.

Também surgido no sul, mais precisamente no interior gaúcho, Felipe M. Guerra apresenta uma curiosa mescla de horror com comédia, em filmes longos como Entrei em pânico ao saber o que vocês fizeram na sexta-feira 13 do verão passado (2001) e Canibais & solidão (2006), os quais assumem a estética do trash e demonstram incondicional paixão pelo gênero. Tal sentimento – não é exagero afirmar – quase sempre é o que move esses novos realizadores amadores, dentre os quais também se destaca o brasiliense Tiago Belotti. Seu primeiro trabalho é A capital dos mortos: o começo do fim (2008), que conta com breves aparições de José Mojica Marins e do falecido Afonso Brazza. Ignorando as óbvias limitações técnicas e orçamentárias, o filme ousa narrar um épico apocalíptico de zumbis, cuja continuação já foi anunciada.

Pertencentes a um nicho criado graças aos próprios esforços, esses realizadores amadores talvez jamais consigam graduar-se ao escalão de cineastas profissionais. Entretanto, à sua maneira, representam o sangue novo no filme brasileiro de horror, mantendo vivo um gênero que ainda não criou tradição em nosso cenário.



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