Portal Brasileiro de Cinema  RITUAL DOS SÁDICOS (O DESPERTAR DA BESTA)

RITUAL DOS SÁDICOS (O DESPERTAR DA BESTA)

1969 . José Mojica Marins
São Paulo, 91 minutos, 35mm, p&b e cor

 
 

Graças a um comentário de Glauber Rocha, Mojica é conhecido como um dos maiores cineastas nacionais. Mas graças também a esse comentário, estará sempre associado a ele um adjetivo que pesa demais quando repetido erroneamente aos quatro ventos: o de “primitivo”. Inevitável, então, que se compre gato por lebre e que Mojica seja vendido por produtores pouco perspicazes apenas como um cineasta trash. A maior prova em contrário dessa vaga pitoresca continua sendo seus filmes. Selvagens, inconformados, gratuitos, absolutamente criativos e livres, são eles, antes de tudo, que ainda respondem à pergunta sobre a genialidade do diretor. Ritual dos sádicos (ou O despertar da Besta, como ficou conhecido depois da celeuma de censura pela qual o filme passou em 1968) é simplesmente o melhor de todos os exemplos para romper com o estigma de primitivo (significando “primário”, “pobre” em linguagem) e trash (que deriva do primeiro estigma). Nem tanto pela temática pretensamente intelectual: um psiquiatra discute com seus colegas de profissão uma experiência feita com pessoas de diversos extratos sociais que acreditaram ter se injetado LSD e que, unicamente por auto-sugestão, deram vazão às mais loucas alucinações a partir da figura do Zé do Caixão. Dessa discussão, partem inúmeros flashbacks, que servem para ilustrar a tese do psiquiatra, com cenas fortes, delirantes e absurdas.

 

Mas se Mojica é gênio, ele o é antes de tudo por sua incrível habilidade cinematográfica. Há lances de montagem geniais em O despertar da Besta, especialmente os que filmam em plano e contraplano o encontro de dois corpos, como se a câmera saísse de dentro da boca de uma mulher e fosse acabar na do homem. Ou então a forma psicodélica e sem nenhum crivo moral com que o diretor filma — em cor — as cenas das alucinações de suas quatro cobaias, de choque imediato porque derivam dos instintos básicos de sexo, violência, crueldade etc. A verdade é que a acid trip não existe: tudo está na cabeça dos participantes. E do espectador, óbvio, pois o LSD aqui é a metáfora da experiência cinematográfica.

Ruy Gardnier

Cia. produtora: Ovni Indústria Cinematográfica, Fotocena Filmes, MM S/C Ltda.

Produção: José Mojica Marins, Giorgio Attili, George Michel Serkeis

Direção: José Mojica Marins

Roteiro: Rubens F. Lucchetti

Fotografia: Giorgio Attili

Montagem e edição: Luiz Elias

Assistente de montagem: Nilcemar Leart

Elenco: José Mojica Marins, Sérgio Hingst, Ozualdo R. Candeias, Andréa Bryan, Lurdes Vanucchi Ribas, Mário Lima, Maurice Capovilla, João Callegaro, Carlos Reichenbach, Roney Wanderley, Jairo Ferreira