Portal Brasileiro de Cinema  LILIAN M: RELATÓRIO CONFIDENCIAL

LILIAN M: RELATÓRIO CONFIDENCIAL

1974/75 . Carlos Reichenbach
São Paulo, 120 minutos, 35mm, cor

 
 
 

Lilian M: relatório confidencial possui uma narrativa fragmentada no melhor estilo do cinema moderno. A narrativa articula-se a partir do depoimento concedido pela personagem-título, em que ela rememora sua vida e seus amantes: a saída do campo quando abandona o marido e os filhos acom-panhando um caixeiro-viajante, o empresário rico que lhe dá um apartamento, o sádico industrial alemão, o grileiro falastrão, o pequeno burocrata repressor e reprimido etc. A personagem deixa a sua apatia inicial construindo uma nova identidade em todos os sentidos; dados significativos nesse processo são a mudança de nome, de Maria para Lilian, e a sua progressiva liberação sexual. Ocorre que o tom do filme não exalta nem condena Lilian, buscando tão-somente mostrar as coisas e não fazer um julgamento sobre a personagem. Há algumas opções estéticas de grande interesse, por exemplo: os envolventes travellings que acompanham a separação de Lilian do burocrata Gonçalves, ou os movimentos semicirculares muito compostos quando o industrial alemão está próximo à piscina e admira um revólver. Por vezes são comentários sobre a linguagem cinematográfica, como na repetição do plano do caixeiro-viajante morrendo, da primeira vez com uma música grandiloqüente, que torna a situação grave, e da segunda apenas com o personagem balbuciando suas costumeiras frases feitas, levando a situação para o ridículo. Mesmo no enquadramento em contre-plongée em que Braga, o empresário rico, faz um verdadeiro discurso no estilo “este é um país que vai pra frente”, Lilian escuta tudo impassível e o filme não julga o comportamento dela.

 

Deve-se destacar ainda a criatividade do trabalho de som. As músicas, por exemplo, pontuam os diferentes gêneros cinemato-gráficos citados: policial, român-tico ou melodrama. Ademais, há brincadeiras sonoras inteligentes, como a apresentação do perso-nagem Vivaldo Lobo, o grileiro de Jales, feita por uma locução em off, que possui, descobrimos logo depois, a mesma voz do per-sonagem. Nos créditos iniciais de O Bandido da Luz Vermelha pode-se ler “Um filme de cinema de Rogério Sganzerla”. A expressão “filme de cinema”, aparentemente redundante, define com perfeição as obras que expressam grande amor por essa arte e que por isso nos fazem amá-las de forma mais intensa. Lilian M: relatório confi-dencial certamente faz parte des-se seleto grupo.

Arthur Autran

Cia. produtora: Jota Filmes

Produção, direção, roteiro, fotografia e seleção musical: Carlos Reichenbach


Montagem: Inácio Araújo

Elenco: Célia Olga Benvenutti, Benjamin Cattan, Sérgio Hingst, Maracy Mello, Edward Freund, Walter Marins, Lee Bujyja, Caçador Guerreiro, José Júlio Spiewak, Thereza Bianchi