Portal Brasileiro de Cinema  A NELSON RODRIGUES

A NELSON RODRIGUES

Haroldo Marinho Barbosa
RIO DE JANEIRO, 1978, 35 MM., 14 MIN. CURTA-METRAGEM

 

Desde que vi a pré-estréia de Bonitinha, mas ordinária e a de Perdoa-me por me traíres (ninguém conseguiu inventar títulos como Nelson), já sabia que se tratava de um gênio; mas foi o Nelson das "Confissões", publicadas em jornal, que me pegou pelo pé. Como ele mesmo me disse anos depois: "É porque eram confissões...". Foi a pessoa mais inteligente que conheci e tinha um humor, então, que nem se fala.Vi, deleitado, José Guilherme Merquior assistir Engraçadinha às gargalhadas no Festival de Brasília de 1981, acompanhando tudo, pois o humor é a chave para chegar a Nelson.

No início dos anos 70, Nelson virou palavrão nas redações dos jornais, por absoluta burrice das esquerdas que não entendiam que o filho dele estava sendo torturado. Em 1976, filmei um único rolinho de cem pés de 16 milímetros reversível, com Nelson na redação do Globo, numa primeira tentativa de fazer um curta sobre ele. O fotógrafo era David Neves, e o editor que nos recebeu foi logo perguntando: "Vocês vão filmar aquela múmia?". Mas foi exatamente o que fizemos. Dois anos depois, repeti a mesma filmagem em 35 milímetros, no A Nelson Rodrigues, o curta que finalmente foi feito, e as coisas na redação não tinham mudado quase nada. O "tarado" de antigamente agora era o "defensor da ditadura" e um nome a ser execrado e se possível banido dos jornais. O problema é que o dr. Roberto gostava dele e todos tiveram que engolir os rascunhos que Nelson despejava diariamente. Durante a filmagem do curta, pude acompanhar de perto suas piadas, inventadas na hora. Um vez, em seu apartamento do Leme, quando Nelson foi informado de que o Fluminense havia vencido o Madureira por escassos um a zero, ele se virou para mim de olhos rútilos e disse, quase sussurrando: "Esmagamos!". Na época em que eu escrevia o roteiro de Engraçadinha, seus telefonemas noturnos eram constantes e sempre terminavam com a mesma advertência: "Capricha... capricha...". Sua língua era o "carioquês", como gostava de chamar o dialeto carioca; e aproveitava para esculhambar as outras: "Falam do inglês... não gosto do inglês! Francês? Há, há, há!".

Ele e Tom Jobim foram meus maiores ídolos e tive a felicidade de conviver com ambos. A Aldeia Campista de um e a mitológica Ipanema do outro são a síntese do que há de mais específico na cidade do Rio de Janeiro. Um já é aeroporto (talvez o único aeroporto internacional com nome de compositor, não de político) e o outro ainda não mereceu uma única e escassa viela. Por que será?

Haroldo Marinho Barbosa

ROTEIRO: Haroldo Marinho Barbosa

FOTOGRAFIA: Antonio Penido

MONTAGEM: Ide Lacreta PRODUÇÃO

EXECUTIVA: Scarlet Moon de Chevalier

ELENCO: Luiz Fernando Guimarães, Nelson Dantas, Xuxa Lopes