Portal Brasileiro de Cinema  SCARFACE: A VERGONHA DE UMA NAÇÃO

SCARFACE: A VERGONHA DE UMA NAÇÃO (SCARFACE: THE SHAME OF THE NATION)

Howard Hawks
ESTADOS UNIDOS, 1932, P&B, 35 MM., 93 MIN.

 

"Olha, eu já roubei coisas de outros diretores, e fico muito feliz e orgulhoso quando alguém rouba alguma coisa de mim. O que significa 'roubar'? Nós só pegamos uma idéia de que gostamos e tentamos fazer com que ela seja nossa", revelava Fritz Lang, em 1959, aos Cahiers du Cinéma. E esse raciocínio aplica-se perfeitamente ao que Nelson Rodrigues fez com Scarface.

Em 1930, um filme sobre um gângster que monta uma poderosa quadrilha de crime organizado em Chicago só pode ser um filme sobre Al Capone. Menos, no entanto, sobre o Al Capone real do que sobre o mito do homem que veio do nada e montou seu império através do sangue, da ousadia e da estratégia (o filme ficou dois anos retido na censura, foi obrigado a ter um novo final moralizante; e era adorado pelo próprio Al Capone). Para adaptar essa história ao Brasil de 1959 a mudança foi radical: o gângster virou bicheiro e o drama de violência virou farsa dramática.

 

 

O que não torna a influência menor. Há, inclusive, um "roubo" explícito: a forma como o corpo morto de Boca de Ouro é depositado na sarjeta e como o poder de outrora passa a ser seu inverso, a insignificância total, um dejeto jogado no meio da rua. Nelson avança mais na humilhação, ao retirar do cadáver o sinal da onipotência do bicheiro: a dentição áurea à qual faz menção o título da peça.

Embora os personagens Boca de Ouro e Tony Scarface Camonte sejam uma espécie de gêmeos dramatúrgicos, o ambiente no qual cada autor os instala faz com que seus comportamentos tenham significações diferentes, apropriadas à época e à mitologia dos lugares em que viveram: o Rio de Janeiro do final da década de 50 e Chicago à época da Lei Seca.

Do Boca de Ouro real, pouco sabemos.Tudo que conhecemos dele são dados contraditórios ditos pela mesma pessoa em três momentos emocionais diferentes (uma espécie de Rashomon esquizofrênico), recurso comum em grande parte da obra de Nelson Rodrigues: o nascimento de uma ficção (do homem) a partir de um delírio ou de um recalque feminino. Nos olhos da mulher, o marginal é mais aura do que carne.

Ruy Gardnier

PRODUTORA: Caddo e United Artists

PRODUÇÃO: Howard Hawks e Howard Hughes

ROTEIRO: Ben Hecht

FOTOGRAFIA: Lee Garmes e L. W. O'Connell

MONTAGEM: Edward Curtiss e Lewis Milestone

MÚSICA: Adolph Tandler e Gus Arnheim

ELENCO: Paul Muni, George Raft, Ann Dvorak, Boris Karloff, Vince Barnett, Karen Morley, Osgood Perkins