Portal Brasileiro de Cinema  ENGRAÇADINHA DEPOIS DOS TRINTA

ENGRAÇADINHA DEPOIS DOS TRINTA

J. B.Tanko
RIO DE JANEIRO, 1966, P&B, 35 MM., 95 MIN.

 

Nelson Rodrigues sempre disse que sua formação literária começou com os grandes folhetinistas franceses: Ponson du Terrail (As aventuras de Rocambole), Michel Zevaco (Pardaillan, O pátio dos milagres), Alexandre Dumas, pai (Os três mosqueteiros, A rainha Margot) e filho (A dama das camélias). Em seus enredos não faltam ação e romance, características fundamentais daquele gênero que, com certeza, também serviu de inspiração aos folhetins que Nelson escreveu, e que vão, num crescendo de qualidade, de Meu destino é pecar a Asfalto selvagem.

Esse último figura entre as obras mais bem-sucedidas da fase das tragédias cariocas. Publicado no jornal Última Hora, e depois em dois volumes, Asfalto selvagem é verdadeiramente popular. O sucesso da primeira parte, Engraçadinha, dos doze aos dezoito, exigiu uma seqüela, Engraçadinha depois dos trinta. O clima é trágico no primeiro livro, e tragicômico no segundo. O intrincado enredo conta-nos a trajetória de uma jovem provinciana que fica grávida do primo e desencadeia uma tragédia que provoca a morte do amado (na verdade seu irmão) e do próprio pai. Quinze anos depois, radicada no Rio, ela vê ressurgirem os fantasmas do passado. Apesar de atrair e despertar devassidões, no fundo Engraçadinha é pura, quase ingênua.

Em 63, seguindo o sucesso de Boca de Ouro, o cineasta J. B.Tanko adaptou a primeira parte do livro, e a chamou de Asfalto selvagem. O filme estreou no ano seguinte, às vésperas do golpe militar, e estourou na bilheteria. Mas foi imediatamente proibido, a pedido de um grupo de esposas de oficiais do Exército. Mesmo assim, em 1966, Tanko realizou Engraçadinha depois dos trinta.

Numa entrevista para a revista Filme Cultura, Nelson demonstrou apreço pelos dois filmes. Com efeito, a adaptação de Engraçadinha depois dos trinta mantém toda a mordacidade do original. Pontuando a tragédia da família suburbana, temos o dr. Odorico, um espertalhão ridiculamente apaixonado — numa grande interpretação de Fernando Torres, ator bissexto, que brilha como poucos no cinema nacional. E, como não podia faltar, há uma bela cena de "sexo artístico", dentro de um carro na chuva; além de ótimos diálogos, alguns dos melhores escritos pelo dramaturgo. O filme é um bom registro audiovisual de como a obra de Nelson era vista pela maioria de seus contemporâneos: onde hoje em dia descobrimos crítica social, divertimento e estilo, eles só viam comercialismo e escândalo.

João Carlos Rodrigues

PRODUTORA: Cinematográfica Herbert Richers e J. B. Tanko Filmes

PRODUÇÃO: Nelson Rodrigues e Herbert Richers

ROTEIRO: J. B. Tanko (baseado em argumento de Nelson Rodrigues)

DIÁLOGOS: Nelson Rodrigues

FOTOGRAFIA: José Rosa

MONTAGEM: Rafael Justo Valverde

MÚSICA: Roberto Nascimento


ELENCO: Irma Alvarez, Fernando Torres, Vera Viana, Nestor Montemar, Mário Petraglia, Carlos E. Dolabella, Cícero Costa, Cláudio Cavalcanti