Portal Brasileiro de Cinema  EU SEI QUE VOU TE AMAR

EU SEI QUE VOU TE AMAR

Arnaldo Jabor
RIO DE JANEIRO, 1986, COR, 35 MM., 104 MIN.

 

O reencontro de um jovem casal após alguns meses de separação serve para Arnaldo Jabor extrair revelações e inquietações das relações amorosas. Nos momentos que antecedem a chegada dela, os dois revelam suas expectativas em relação às estratégias do outro. Mais do que uma interminável partida de pingue-pongue passional, como teria dito um crítico italiano em Cannes, acompanhamos o processo de desconstrução desse casal.

Podemos observar o diálogo com o dramaturgo Nelson Rodrigues, cuja obra é muito cara a Jabor, nessa dúvida em relação às bases do casamento burguês. Quando vemos cenas do casamento dos dois com imagens preto-e-branco e figuração caricatural, o personagem masculino ironiza a inocência de ambos. Não há a pergunta "Você é feliz?" — com em Beijo no asfalto —, mas o deboche autodefensivo: "Que mania que você tem de ser feliz!".

A imagem do "homem de bem", chave para o papel masculino patriarcal, também é questionada quando o personagem revela, fascinado, que, após transar com um travesti, lembrara que era pai de família, apesar de se sentir uma vedete. Também ecoa no filme a sonoridade bombástica das frases rodriguianas: "Eu sou a dama do lotação. A putona de Ipanema", diz a personagem feminina, que depois acrescenta, numa fala que poderia ser de alguma peça de Nelson, que toda mulher brasileira deveria ser louca e prostituta. Mas logo em seguida ela afirma que está se sentindo louca e desamparada, mudança que revela a distância entre aquele festival de falas e desejos e a realidade. As vontades de excesso expressam, mais do que um desejo real, uma inconsistência e um vazio.

Apesar de o filme se basear num jogo de subjetividades, há uma vontade de associá-lo a um discurso mais amplo, mesmo que para explicitar seu deslocamento. As auto-referências irônicas — o casal perfeito de um país em ruínas e a citação final de Deus e o Diabo na Terra do Sol ("Mais fortes são os poderes do povo") — apontam nesse sentido. Mas o trocadilho entre as palavras "povo" e "polvo" — o polvo do filme faz referência aos braços do amor que prendem, como no poema de Jacques Prévert dedicado a Lautréamont — revela a limitação do espaço social naquela discussão toda.

Alessandro Gamo

PRODUÇÃO: Hélio Paulo Ferraz e Arnaldo Jabor

ROTEIRO: Arnaldo Jabor

FOTOGRAFIA: Lauro Escorel

MONTAGEM: Mair Tavares

CENOGRAFIA: Sérgio Silveira e Maria Helena Salles

DIREÇÃO DE PRODUÇÃO: Flávio Tambellini

DISTRIBUIDORA: Embrafilme

ELENCO: Fernanda Torres, Thales Pan Chacon