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Ciné-tracts

(Cine-panfletos) nº 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 23, 40 e 1968

França, 1968, p/b, 16 mm, 2-4’ cada



Costuma-se dizer que os ciné-tracts [cine-panfletos] foram iniciados por Chris Marker e realizados durante o movimento de maio de 1968, mas a maioria foi feita depois. Doze deles são atribuídos a Godard, que os intitula film-tract [filme-panfleto], seguido de um número. Para realizá-los, frequentemente em seu apartamento, ele contou algumas vezes com a ajuda técnica do diretor de fotografia Armand Marco, que pouco depois se juntaria ao grupo Dziga Vertov. Afora o film-tract no 1968, os outros de Godard recorrem a três procedimentos: A) Alternância entre fragmentos de texto de uma citação e imagens nos nos 7, 8, 9, 13, 14 e 16. B) Composição de intertítulos sobrescritos em documentos e fotografias nos nos 12, 23 e 40. C) Interpelações “Reflitam” e “Olhem as coisas de frente” alternadas a tais composições nos nos 10 e 15. Nas notas abaixo, indico o procedimento pela letra entre parênteses.

No film tract no 7 (A), Godard retoma declarações de um comunicado do general De Gaulle para a televisão de 7 de junho de 1968, alternando-as com imagens que as desmentem palavra por palavra (“Há uma solução, é a participação que muda a condição do homem” e “a República e a Liberdade serão asseguradas. O progresso, a independência e a paz vencerão”). O primeiro ciné-tract de Godard não pode, portanto, ter sido realizado antes de 8 de junho de 1968 (já no fim do movimento) nem muito tempo depois, já que tais declarações só tinham seu alcance político no âmbito da campanha eleitoral para as eleições legislativas antecipadas de 30 de junho, que visavam inibir o efeito de maio. De Gaulle preconizava ali a “participação”, isto é, a “terceira solução”, apresentada como alternativa às duas primeiras (o comunismo e o capitalismo): uma espécie de associação formal dos assalariados às decisões da empresa. Podemos supor que esse ciné-tract intervém, portanto, no contexto dessa campanha eleitoral, que trouxe aos gaullistas uma maioria esmagadora na assembleia. Ele teria sido realizado, então, entre 8 e 30 de junho, em meio à filmagem de One plus one (1968) em Londres.

O film-tract no 8 (A) retoma duas fórmulas maoístas seguindo o mesmo procedimento de alternância entre fotos e intertítulos manuscritos. A primeira é a da bandeirola dos maoístas da UJCml (União das Juventudes Comunistas marxistas-leninistas), a quem Godard dedicou La chinoise (1967) no momento da grande manifestação de 16 de maio de 1968: “Os operários tomarão, das mãos frágeis dos estudantes, a bandeira da luta contra o regime antipopular”. Ela atesta uma reviravolta súbita da UJCml, que nos primeiros dias do movimento rejeitou seu caráter estudantil “pequeno-burguês”. A segunda convoca a “segurar a revolução com uma mão e a produção com a outra”. É uma temática recorrente nos textos do PC chinês durante a revolução cultural e que atesta, por fim, o receio de que as perturbações dessa revolução afetem profundamente a produção do país e o mergulhem numa situação de penúria.

O film-tract no 9 (A) retoma uma formulação de Fidel Castro frequentemente invocada por Godard naquele período: “Daqui para a frente, não aceitaremos mais nenhum tipo de verdade evidente. As verdades evidentes pertencem à filosofia burguesa”. O procedimento é igualmente o de uma alternância entre intertítulos manuscritos e fotos de ilustração ou de contraponto.

O film-tract no 10 (C) adota uma nova fórmula: intertítulos convidando à reflexão durante o número de segundos que dura o plano seguinte (“Reflitam por dez segundos”) e alternados com a composição, frequentemente enigmática, de escritos de Godard sobre fotos ou documentos.

O film-tract no 12 (B) declina uma citação de Che Guevara numa série de composições: “A sociedade como um todo deve se converter em uma gigantesca escola. A juventude constitui a argila fundamental da nossa obra. Depositamos nela nossa esperança e preparamo-la a tomar a bandeira”.

O film-tract no 13 (A) alterna fotos das barricadas de maio com intertítulos manuscritos por Godard, formando progressivamente a frase que intitula um texto de Mao: “Uma faísca pode incendiar toda a pradaria”. Alguns intertítulos contêm letras riscadas, em que a parte não riscada constitui a palavra da frase, e o conjunto, outra palavra. Por exemplo, a palavra Peut [Pode] é expressa por “Peugeot”.

O film-tract no 14 (A) adota exatamente o mesmo procedimento de alternância, em torno da frase: “As forças da ordem sempre têm laços de sangue com a desordem sexual”.

O film-tract no 15 (C) inspira-se no procedimento do no 10, mas em vez de “Reflitam dez segundos”, a injunção é: “Olhem as coisas de frente”, em alternância com uma série de composições de texto sobrescritas nas imagens. O intertítulo final, sobre a foto de uma mulher nua, é “Olhe as coisas de frente sua vida toda, se não quiser ser fodido pela cultura burguesa”.

O film-tract no 16 (A), em uma alternância de intertítulos e fotos de maio, declina a frase: “Os estudantes na fábrica e os operários na universidade, solidários, para lutar de forma eficaz contra a cultura, a arma favorita da burguesia”.

O film-tract no 23 (B), conforme o mesmo procedimento que o no 12, desenvolve uma citação de Che Guevara pela composição de intertítulos sobrescritos em fotos e documentos: “Permita-me lhe dizer, correndo o risco de parecer ridículo, que o verdadeiro revolucionário é guiado pelos maiores sentimentos de amor. Na nossa ambição de revolucionários, tratamos de avançar o mais rápido possível, abrindo caminho. Mas sabemos que precisamos de toda a nossa força na massa de trabalhadores, e que esta poderá avançar mais rapidamente se a estimularmos com nosso exemplo”.

O film-tract no 40 (B) também adota esse procedimento de composição de intertítulos compostos e sobrescritos em fotos e documentos, em torno da frase: “Na teoria, a incumbência capital para o movimento comunista é desenvolver com todo o rigor e audácia a ciência e a nova filosofia, unindo-as às exigências e invenções da prática da luta das classes revolucionárias”.

Por fim, com um caráter de “edição especial”, o film-tract no 1968 (chamado amiúde pelo título Le rouge [O vermelho]) é provavelmente o primeiro envolvendo Godard, que dá sua contribuição técnica ao pintor Gérard Fromanger. É o único ciné-tract colorido, e também o único realizado durante o mês de maio, no dia 23. Marin Karmitz faria uma cópia um ano depois. Seu número “1968” atesta seu caráter excepcional em relação à série, talvez também porque o planejamento dos filmes e, portanto, a atribuição de seus números ainda não estivessem definidos naquele momento. Após a cartela de título, um plano contínuo começa totalmente invadido pelo vermelho; depois, um lento movimento, da câmera ou da superfície filmada, nos mostra que essa cor vermelha escorre sobre uma superfície branca. Pouco tempo depois, a superfície invadida pelo vermelho não está apenas branca, mas também, a partir de uma linha bem nítida, azul. É nesse momento que o escorrimento vermelho é decifrado como a hegemonia da cor revolucionária da bandeira francesa.

David Faroult

Traduzido do francês por Tatiana Monassa.



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