Festa na Boca

Em 1976, naquela alegria de fechar o ano, pensei comigo: “Vou fazer uma beberagem de fim de ano, acho que não vai mal, vai parecer que é de graça mas todo mundo vai pagar um pouco”. Falei com uns caras de um certo carisma, certa liderança naturalmente, “vamos fazer uma festa”. Não deu pra comprar muita cerveja, comprei uns garrafões de pinga e limão. O pessoal correu atrás pra buscar um troco pra isso. Eu fiz um memorando e fui à delegacia, era um delegado brabo pra burro, pedi pra ele autorização pra fechar a rua, ele mandou fechar a rua. Então interrompemos o quarteirão da Triunfo, Gusmões e Vitória, tinha um carro da PM de cada lado. De repente chegou uma banda tocando e também o pessoal de capoeira. Então eu lembrei de fazer uma homenagem para o pessoal de cinema, um negócio mais ou menos assim, como era uma festa de cinema eu inventei uma premiação: a Vênus Boca do Lixo, a Miss Boca do Lixo, o melhor ator da Boca do Lixo, melhor assistente, melhor eletricista, tudo isso, só não fiz melhor diretor.

 
Pessoal do caballito de Totóra - Norte do Perú.

Aí um cara recebeu um telefone da Lynx, era o Sady Scalante. Ele disse que se eu quisesse fazer um documentário, que fosse na produtora buscar câmera e tal, que ele bancava a co-produção. Então passei a mão no cara e fiz a co-produção. Por isso fiz o Festa na Boca e achei aquilo muito interessante. Todo mundo dançou, comeu e bebeu, era o fim do ano de 1976. Todo mundo pensava que o cinema estava lá em cima, mas ele estava indo para baixo. Porque a pornochanchada cumpriu uma coisa assim de moda, de informações sexuais, que vieram da Europa. A produção era mais ou menos barata, mas de repente começou a cansar e ninguém investiu mais para ver se segurava o público. Por exemplo, o Galante, ele punha numa fita 100 mil cruzeiros, se ela não dava o que ele queria, na próxima fita ele investia apenas oitenta. Isso ajudou a Boca a ir para a merda. A pornochanchada cansou como filão, como tema. Existem ciclos, no cinema americano o banguebangue esteve lá em cima e também foi para o buraco. Nesse momento, mais ou menos, os militares começam também a tentar ser mais democráticos, uma democracia relativa, e os donos de cinema já não tinham muito mais interesse em ser co-produtores das fitas. O Galante trabalhou não sei com quem, o David trabalhou com a Sul e vai por aí afora, sem falar na Embra que não era capital privado, era outro negócio. Quando chega por perto de 80 já tem o filme pornográfico, para o público que precisava de uma informação um pouco mais apimentada e mais acentuada. Porque a censura primeiro liberou a mulher pelada de costa, depois poderia ser de frente sem pentelho, depois pode entrar de qualquer jeito, agora os homens só entravam de cueca – então os italianos perguntavam “por que brasileiro só trepa de cueca?”. Então, o Rossi fez um pornô, todo mundo foi ver e ele faturou uns seis, sete, 10 milhões. O cinema da Boca acabou porque não renovou.