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MEU NOME É TONHO

Ficção, 1969, 35 mm, P&B, 95 min

 
 

 

Criança é raptada por ciganos errantes com quem passa a viver, sem conhecer seus pais. Já rapaz, Tonho abandona os ciganos e vai viver por conta própria, encontrando em sua trajetória uma bela mulher, que tem um irmão desaparecido, e um bando de facínoras extremamente violentos.

Depois do inesperado A margem, (“as buscas insensatas levam a descobertas inesperadas”, diria Bressane), belo ponto de partida de seu cinema “imperfeito”, Candeias continua a cada fita afinando seu estilo, realizando livremente suas provocações espontâneas em celulóide. Desta vez, no lugar do subúrbio (sub-urbe) paulistano, mestre Ozu muda o eixo da câmera e cria seu primeiro faroeste caboclo (vide ainda A herança e Manelão), Meu nome é Tonho, que, como todo grande filme de ficção, também é um grande documentário – mas um documentário, digamos, diferente. Há na fita uma fatura crua, com intenções evidentemente despojadas e, de certa forma, realistas (a ausência de pudores é radical), mas dizer apenas isto daria uma imagem pálida do que é o filme. O cinema de Candeias é tão mais rico pois se insinua por diversos temas e interpretações, sem prejuízo ao conjunto, porém.

Falar em poesia-menos é um caminho claro e bastante rico para apreender seu cinema; afinal, como não admirar a alta temperatura informacional deste cinema “pobre”? Como não guardar na memória, por exemplo, a simplicidade da cena inicial – uma das mais lindas imagens de todo cinema brasileiro – com a cigana dançando descalça pelo mato ao som de “Menina”, de Paulinho Nogueira, tocada com um acento típico dos spaghetti westerns? (Aliás, falando em faroestes italianos, vale lembrar que Leone é uma sintonia talvez secundária, mas que sempre perpassa Tonho.) Idem para certa vocação de estranhamento provocada – e muito comentada – por suas imagens não-oficiais e anti-naturalistas. Artista formado pela vida, Candeias talvez seja um criador de vulgaridades. Tanto melhor, pois assim sabemos que estamos mais perto da realidade e não das habituais imagens condicionadas.

 

Poderíamos falar ainda sobre como seus filmes se situam no horizonte do provável (e não no da certeza), no plano visual, estético, o que, ao contrário do que se possa pensar, não é pouco em se tratando de Candeias. Em Meu nome é Tonho, a lei seria a do dinheiro, mas, como para seus personagens dinheiro não há, o poder é exercido na bala mesmo – ou seja, a vida não vale nada. O que há de mais notável em tudo isso é a maneira como se consegue seguir em frente sem as convencionais muletas da psicologia, da moral barata ou da sociologia maniqueísta. Aqui, é preciso repensar a noção de belo: as coisas são o que são, e ponto. Assim como para alguns “uma mulher é uma mulher”, em Tonho também se suprime qualquer noção adjetiva – neste caso, em troca do real em contato imediato com o olho do espectador. Alguns, os tolos incorrigíveis, dirão em sua arrogância que se trata de um cinema mal feito, canhestro; outros, porém, saberão ver a beleza e a liberdade destas imagens anárquicas e, às vezes, necessariamente sórdidas, estes são os ilustrados, para eles há esperança.

Juliano Tosi

Direção e roteiro: Ozualdo R. Candeias.

Fotografia: Peter Overbeck.

Montagem: Luiz Elias.

Música: Paulinho Nogueira.

Produção: Manuel Augusto Cervantes e Nilza de Lima.

Cia. produtora: Produções Cinematográficas Ibéria.

Elenco: Jorge Karam, Bibi Voguel, Nivaldo Lima, Edio Smanio, Walter Portella, Toni Cardi, Cláudio Vianna, Aluísio de Castro, José Ferreira e Mário Lima.

Prêmios: Melhor Diretor no III Festival de Cinema de Marília, em 1969. - Governador do Estado de São Paulo de melhor edição e revelação de 1969 - Menção honrosa no festival de cinema de São Carlos de 1969.