Portal Brasileiro de Cinema  UMA RUA CHAMADA TRIUMPHO 1970/71

UMA RUA CHAMADA TRIUMPHO 1970/71

Não-ficção, 1971, 35 mm, P&B, 9 min

Através de fotografias de autoria de Ozualdo Candeias registra-se a região da Boca do Lixo paulistana e as pessoas do meio cinematográfico que por ali circulavam.

 

“Esses caras, ou melhor, alguns destes caras falam de cinema a sério. O que seria ser sério em cinema? Quem é ou quem tem sido sério em nosso cinema?” Assim termina a primeira versão de Uma rua chamada Triumpho: uma série de closes com grande-angular de algumas das maiores vozes da Boca – Mojica, Person, Roberto Santos e o próprio Candeias fazendo caretas para a câmera, sorrindo etc. –, o que, por outro lado, é, digamos, bastante divertido. Pois parece não ser outra coisa o que Candeias discute, por caminhos tortuosos, nesses dois curtas: enquanto Sganzerla pregava o cinema pejorativo e avacalhado dos “melhores filmecos do Brasil”, Reichenbach falava dos ângulos propositalmente estúpidos de seus filmes, e por aí vai. Tratam-se de obras feitas por quem, sabiamente, não leva o cinema, a vida e a si mesmo, muito a sério.

Narrado em tom de ironia (como boa parte das falas em Candeias), Uma rua chamada Triumpho talvez nada mais seja do que um valioso ajuste do estilo de criação a seu objeto. Aqui – e sempre! – Candeias filma como não se deve filmar, e aí chegamos a um dado nada não-desprezível: comuma fala capaz de romper com certo cerimonial do documentário (os melhores filmes do “gênero”são sempre os que conseguem fazê-lo), ele faz das duas versões do filme os mais fiéis e belos retratos daquela subindústria de cinema que se formava em torno da Boca do Lixo. Se hoje a Boca é um terreno estéril, era de lá, no entanto, que saía grande parte das fitas nacionais nos anos 70, quando a produção chegava a cem filmes/ano e ocupava um terço das salas do país. E não deixa de ser uma curiosidade digna de uma antologia testemunhar as latas de filmes (das “obras-primas aos maiores bagulhos”) saindo das distribuidoras carregadas em carroças! Alguns deles, não poderia deixar de ser, dirigidos, produzidos ou seja lá o que for por muita gente boa, todos – ou quase – aparecendo num dos dois filmes: de Zé Mojica e seu estado-maior de Meias-noites e Estas noites a Oswaldo Massaini (pioneiro da rua do Triunfo ao lá instalar sua Cinesdistri, em 1949), passando por Anselmo Duarte, Person, Carlos Reichenbach, Silvio Renoldi, Jairo Ferreira, a dupla Alfredo Palácio se Antonio Galante, e muitos mais. Por fim, o locutor nos conta que “a polícia garante que a Boca vai deixar de ser boca”, o que hoje não duvidamos: os filmes sumiram e a boca foi calada. Mas e o lixo, onde ficou?

Juliano Tosi

Direção, roteiro e fotografia:Ozualdo R. Candeias.

Montagem:Luiz Elias.

Música:Vidal França.

Produção:Jorge Alberto M. Teixeira, Antônio Roberto de Godoy e Cesário Felfiti.

Cia. produtora:Cinegeral e Long Filmes Produções Cinematográficas.